Mens sana in corpore sano

No último texto terminei com uma nota de esperança. Esperança de dias melhores, esperança numa melhoria no panorama geral que fosse garante de dias mais livres, mas não aconteceu. E não só mantivemos o dever geral de confinamento como vimos os números aumentarem como uma onda que promete derrubar-nos. Números de infetados e de mortos. Números tão constantes e tão avassaladores que hoje já não sabemos distinguir os números de ontem dos de anteontem. Números que são pessoas, pais, filhos, maridos/esposas, amigos, vizinhos. Pessoas que deixam, como sempre deixam aqueles que vão antes de nós, um sabor amargo na boca, a sensação de que podíamos ter feito mais e uma saudade tão tipicamente portuguesa. Ensinaram-nos, os mais velhos, que depois da tempestade vem sempre a bonança. Sabemos também que, quando muito perto, perdemos a capacidade de ver o todo. E é esta incapacidade paralisante que devemos evitar porque sem horizonte é impossível navegar. E esta sensação de perda de horizonte é muitas vezes manifestada através de comportamentos reveladores de transtorno de ansiedade. A ansiedade é um termo geral para vários distúrbios que causam nervosismo, medo, apreensão e preocupação. Os principais sintomas são: constante tensão ou nervosismo, sensação de que algo mau vai acontecer, problemas de concentração, medo constante, descontrolo de pensamentos nomeadamente dificuldade em esquecer o causador de tensão, preocupação exagerada, problemas de sono, irritabilidade e agitação motora. Naturalmente, cada um revela estes sintomas de maneira própria.  O Centro de Estudos e Investigação em Saúde da Universidade de Coimbra realizou um estudo sobre o impacto do confinamento da qualidade de vida dos portugueses. Os resultados mostram que os respondentes que se encontravam em confinamento reportaram níveis elevados de ansiedade, uma menor qualidade de vida relacionada com a saúde (QVRS) e que pessoas com elevados níveis de ansiedade tenderam a ter menor QVRS. As mulheres e os idosos reportaram níveis mais altos de ansiedade e pior QVRS. Os níveis mais altos de ansiedade nos idosos podem ser explicados pelo fato de pertencerem ao grupo de risco da pandemia de COVID-19 (cit. Lara Noronha Ferreira). Ora a questão que se impõe é: com esta realidade que estamos a viver como é que evito o desenvolvimento da ansiedade no meu mais velho? E não sendo já possível evitar como é que reajo quando identificar sinais de ansiedade por forma a melhorar a sua qualidade de vida? Em primeiro lugar é absolutamente essencial uma abordagem cuidadosa pois, muitas vezes, a pessoa em questão não tem consciência do estado em que se encontra. É importante, através de um diálogo adequado e respeitoso, desconstruir os comportamentos como a preocupação ou o medo por forma a perceber se são justificáveis devido à situação em que nos encontramos ou se já estão presentes a um nível paralisante. O seu mais velho não consegue ver mais nada na televisão a não ser noticias? Não consegue manter um diálogo sobre outros temas? Verbaliza ter sintomas associados à ansiedade como insónias, tremores, sudorese excessiva, palpitações cardíacas ou outros?  O mais indicado, se não conseguir através de uma acção constante de pacificação, diálogo e manobras de distração será procurar ajuda junto de um profissional de saúde mental. Lembrando sempre que não há mal nenhum recorrer a um profissional quando se precisa de ajuda e que a saúde mental é tão importante como a saúde física (não diria a alguém com uma dor paralisante na perna que não vale a pena ir ao médico que aquilo há-de passar, pois não?). Nestes tempos, em que é ainda incerto quanto mais tempo demorará até voltarmos a poder circular livremente, é absolutamente essencial cuidar também da saúde mental dos mais velhos. Manter uma conversação com um grau de complexidade adequado à pessoa, promover interacção social (a possível e segura dentro do quadro em que vivemos) e a participação activa nas tomadas de decisões- ainda que irrelevantes- são atitudes diferenciadoras do que será a prevenção da perca de capacidades cognitivas dos mais velhos. Porque as paredes não falam, a televisão não lhes responde e a interacção social e a capacidade de cognição também é uma actividade que precisa de prática para não se perder. Lembre-se: cuidar da saúde mental é cuidar da pessoa que ama porque, também os mais velhos nos ensinaram , “mente sã, corpo são”.