O cuidado de uma pessoa com demência
No texto anterior vimos que cuidar de um familiar mais idoso causa, na maioria dos casos, alterações profundas na maneira como a família e a rede de suporte funciona e se organiza. Se estas alterações são significativas quando o idoso ainda mantém as suas faculdades mentais intactas são, naturalmente, ainda mais profundas quando este caso não se verifica. Já vimos também, anteriormente, que não existe unanimidade absoluta na definição de demência. No entanto podemos usar a definição seguinte: “um síndrome adquirido, de natureza orgânica que se caracteriza por uma deterioração permanente da memória e de outras funções intelectuais, que frequentemente se acompanha de outras manifestações psicopatológicas, salientando-se ainda que ocorre sem alteração do nível de consciência e afeta o funcionamento social e ocupacional do individuo” (Carrasco et al,2002). Mas em que é que esta se traduz na realidade do dia-a-dia? Em fases iniciais traduz-se, muitas vezes, em pequenos esquecimentos que tantas vezes os familiares e os que estão mais próximos desvalorizam dizendo: “isso é normal…é da idade!” ainda que ser idoso não seja necessariamente igual a perder capacidade de memória. E por esta altura, há medida que as queixas referentes aos lapsos de memória vão aumentando a família começa a assegurar os pagamentos das contas da casa porque “é muita coisa e o pai/mãe já não consegue tomar conta de tudo” e a organizar a medicação porque “os nomes são tão difíceis e a ordem tão confusa que não vale a pena andar com essa preocupação”. E com o passar do tempo o pai/mãe vai deixando de saber fazer as suas actividades de vida diária. E isto significa que a toma do banho deixa de ser tão regular e a confecção dos alimentos se torna um verdadeiro desafio e perigo. É nesta fase que comummente se assumem os cuidados do ente querido. Quando se faz referência ao acto de cuidar está-se a falar, mais frequentemente, do cuidado instrumental que se refere à prestação de cuidados informais que podem ser executados, preferencialmente, no domicílio e que habitualmente fica sob a responsabilidade de elementos da família, amigos, vizinhos ou outros designados como cuidadores informais. Do ponto de vista do que é o processo de cuidar de uma pessoa com demência é possível identificar uma evolução da complexidade e natureza do processo que está directamente ligado à evolução da doença em si. Se numa fase inicial o processo de cuidado passa principalmente pela supervisão e pela tomada de medidas preventivas para protecção do idoso numa fase mais avançada já significa que são assumidos cuidados mais práticos ao nível das actividades básicas da vida diária. Não existindo forma de padronizar os cuidados a um idoso com demência é possível criar mecanismos de comunicação e de promoção do bem-estar que ajudam. Exemplo disso é Tony Luciani, um artista cuja mãe desenvolveu doença de Alzheimer , tendo este assumido os cuidado da mesma conseguiu encontrar uma forma de se relacionar com a mãe garantindo que esta ainda se divertia e tinha qualidade de vida. Se tiver curiosidade veja o Ted Talk ( https://www.youtube.com/watch?v=HSfMx6Mr1eE) onde Tony conta a sua história chamada “Um percurso fotográfico de uma mãe e do seu filho, através da demência”. O que funcionou para Elia (mãe de Tony Luciani representada na foto acima tirada pelo próprio) pode não funcionar para outra pessoa, mas o que importa é que a relação cuidador- pessoa com demência seja baseada no respeito pela pessoa e pela sua história de vida. Esta é a base para que o cuidado seja mais humano e mais digno. No próximo texto veremos como é que a relação cuidador- idoso se desenvolve e quais são as suas especificidades.
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